Ventinho sempre foi o amigo invisível que embalava as noites de Sofia. Mas, numa noite mágica e silenciosa, ele desaparece sem aviso. Determinada a encontrá-lo, ela parte numa jornada cheia de mistério, amizade e descobertas.

Sofia tinha oito anos e vivia numa casa amarela, no pé de uma encosta coberta de margaridas.
Antes de se deitar, ela gostava de apoiar os cotovelos no batente da janela e deixar os olhos se perderem no céu. Contava as luzes que piscavam lá em cima e inventava que cada uma era uma pequena vela protegendo o sonho de alguém.
Seu quarto era pequeno, mas acolhedor: paredes cheias de desenhos que ela mesma pintara, cortinas leves que balançavam com o menor sopro de ar e uma cama branca coberta por um cobertor amarelo com bordas gastas.
Mas o que Luna mais amava era o som do vento que passava pela janela. Ela dizia que ele tinha voz — suave e brincalhona, como se quisesse conversar.
Desde os primeiros anos, Sofia jurava que o vento sabia conversar. Nos dias em que seu coração pesava, ele parecia surgir mais depressa, brincando com as pontas do seu cabelo e trazendo murmúrios que ela não compreendia, mas que deixavam tudo mais leve.

Naquela noite, a lua parecia mais cheia do que nunca, suspensa no céu como um farol prateado. A luz entrava pelas cortinas de Sofia e pintava seu quarto de um brilho suave. Ela esperava, como sempre, sentir o sopro leve atravessar a janela, mexer nos fios do seu cabelo e balançar a ponta da colcha. Mas nada aconteceu.
O ar estava imóvel. As folhas das margaridas lá fora pareciam congeladas, como se alguém tivesse apertado o botão de pausa no mundo. Até o aroma doce que costumava entrar pela janela, misturando flores e terra molhada, não chegava. Havia apenas silêncio. Um silêncio tão espesso que até o som do próprio coração de Sofia parecia alto demais.
Ela se levantou, encostou o rosto no vidro e ficou à espera de qualquer sinal: o menor arrepio na pele, um farfalhar tímido nas árvores… mas só encontrou o vazio. Uma pontada de estranhamento atravessou seu peito. Como poderia dormir sem aquele amigo invisível que sempre a embalava?
Virou-se para voltar à cama, tentando se convencer de que era apenas uma noite comum. Mas então, vindo de muito longe, quase imperceptível, escutou algo diferente. Não era o sussurro familiar do vento — era um som trêmulo, como um choro contido. Pequeno e frágil, perdido na noite.
Sofia prendeu a respiração e ficou imóvel. O som se repetiu, mais nítido. Não vinha de dentro da casa. Estava lá fora, espalhando-se pelo campo parado. E, mesmo sem entender o motivo, ela sentiu que aquele choro tinha algo a ver com o vento que faltava.

Sem pensar duas vezes, Sofia calçou suas pantufas, pegou sua lanterna em forma de estrela e desceu devagar para não acordar a mãe. Ao abrir a porta da frente, encontrou a noite parada — nada se movia, nem mesmo as pétalas das flores.
Seguindo o som do choro, ela atravessou o campo de lavanda. A lua iluminava seu caminho, mas o ar estava estranhamente imóvel.
Logo, encontrou algo curioso: um redemoinho pequenino, do tamanho de um gato, encolhido no chão. Ele tinha forma de espiral translúcida, como fumaça prateada, e parecia… triste.
— Ventinho? — perguntou, com o coração acelerado.
A espiral levantou a “cabeça” invisível e, numa voz fina e trêmula, respondeu:
— Sou eu, Sofia… mas não consigo dançar hoje.
Ele explicou que havia perdido sua “Canção do Vento”, uma melodia invisível que dava força e movimento a todo o ar. Sem ela, não poderia embalar as árvores, nem brincar com as nuvens, nem acalmar crianças para dormir.
A melodia, contou ele, tinha sido levada por um Corvo Noturno, uma ave que roubava sons e os escondia nas montanhas para guardá-los só para si.



